quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

A estranha perfeita



               Ela não briga. É calma, serena, pacífica. Sorri o tempo inteiro. Um sorriso bonito, desses que toma o rosto todo, que enruga o nariz, que desequilibra os olhos. Corpo suntuoso, bom gosto, diferente das outras. Inteligente, assimétrica, espontânea, diz coisas que às vezes ninguém entende.               
               E é bonita. Bonita mesmo. Bonita como uma flor.
               Perfeita. Tem pele macia, bochechas rosadas, os lábios finos, jeito de interior. É linda porque é única, não tem outra igual. É de uma doçura que se desmancha na boca.
               É perfeita.
               É estranha. Tão estranha que se esconde, se afasta, não diz nada, nem ouve. Fica quieta, parada num canto, admirando o céu e se deixando levar por um bando de gaivotas imaginárias. Não vê o tempo passar. Já perdeu a noção do tempo há tempos. Sempre tão sozinha em seus pensamentos, misteriosa, quase psicopata. Vive de cabeça cheia: ideias, problemas, soluções. Tem amigos estranhos... Uma se chama Angústia, é uma chata que sufoca a gente por qualquer coisinha. A outra é a Ansiedade, que tem aversão a manicures.
               É estranha porque sente demais. Ama demais. E acredita na perfeição que não existe. Acredita que pode mudar o mundo, as pessoas, as histórias. Tem o riso nervoso, já percebi. Não é normal alguém que ri de tudo, até mesmo de quando a gente reclama do calor. Quer proteger, manter, preservar. Insegura, descabida, um núcleo que não cabe no citoplasma. É complexa demais, sabe? Tem cheiro de problema. Cheiro doce, muito doce. Faz a gente espirrar, e quando a gente espirra, é como se tudo sacudisse.
               Não é perfeita. O que a salva é a imperfeição.
               Mas é estranha. Assustadora. Um monstro de uma cabeça que vale por infinitas – com todos os seus problemas. 
 (Tumblr)

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