quinta-feira, 19 de novembro de 2015

O trompete azul



                A cena era assim: logo no primeiro episódio da série - o episódio que conquistaria produtores e um público assíduo por novos vícios -, após o primeiro encontro com a garota que lhe tirara dos eixos, o cara foi lá e disse que a amava – ninguém é capaz de mensurar o tamanho deste erro em um relacionamento (principalmente em um relacionamento que ainda não começou). Mas antes disso, antes de dizer as palavras tão queridas por uns e tão temidas por outros, ele fez algo muito maior. Inquieto (não sei qual o seu signo), o personagem roubou o trompete azul que despertara a atenção da moça no primeiro encontro e apareceu com o objeto na mão e um sorriso assustado em sua janela.
                A partir daquele momento, eu entendi tudo. Tudinho mesmo.
                Aquilo era muito mais do que uma prova de amor. Aliás, essa definição é bem fraquinha – uma Jéssica da vida que pode até ser boa de briga, mas que não, não é nem um pouco eficiente.
                Ted Mosby (eis o nome do cidadão) me ensinou que o trompete azul é o nome científico do amor – ou talvez seja o contrário, não sei. Ele me mostrou que antes das tais palavras, é preciso ter entrega, coragem, resiliência – ah, e percepção de risco também. Mas além de tudo, o amor é estranho. Exótico. Emoldurável. Uma canção, talvez – várias canções. O amor é aquilo que a gente acha inútil, mas quando percebe, não consegue se livrar tão fácil. Eu que já escrevi tanto sobre o amor, que já roubei alguns trompetes azuis e não tive um final feliz como nosso Teddy Boy na série, ainda não entendo esse feitiço, essa macumba, essa doença, esse instrumento que me rouba o ar, que me faz delirar com o som, com a cor, com o peso. Mas eu sei, meus caros, que esse tal sentimento que é muito mais do que um sentimento, e é também muito mais do que a prova de que você sente e por isso não é um psicopata: é também a prova de que você se arrisca. Petisca. Não fica com fome.
                A gente sofre, sim. Ted sofreu por nove temporadas. Ted existe – todos nós temos um lado extremo-criativo-revolucionário-dramático-quase-chato-de-tão-eufórico dentro de nós. Ted teve perdas gigantes em sua vida. Mas o trompete azul, ah, ele foi até o fim. Até o último episódio. Até a última sentença.
                Vamos continuar sofrendo, entrando em eternas rehabs para esquecer, transformando dramas à la Nicholas Sparks (muito clean esse menino, o amor é infinitamente mais hard core) em caixinhas trabalhadas na decoupage cheias de lembranças bonitinhas, porém não menos destruidoras de lares. Essa é a vida, esse é o jogo, e só perde quem não joga.
                Só perde quem não tem coragem de roubar seu trompete.


Observação: CERTEZA que Ted Mosby é canceriano.
Observação 2: Uma salva de palmas para How I Met Your Mother.
Observação 3: Nem Friends nem HIMYM. As duas. Simplesmente. 

(Ouça Downtown Train, EBTG) 

(Google)

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