domingo, 15 de novembro de 2015

A tragédia da opinião



                Que o verbo “opinar” está na moda, todo mundo já sabe. De repente, ficou mais fácil achar alguém com opinião do que com bunda (fazendo uma vaga conexão com aquele dito que eu sempre troco as palavras na hora de reproduzir). A princípio, ter o que pensar seria a maior prova de que não somos amebas que vivem dando rolês por aí.
                Até o dia em que ter o que pensar perdeu a importância para o ato de gritar o que se pensa – mesmo que você não pense absolutamente nada.
                Entre bilhões de litros de lama tóxica em Minas e outros litros de sangue que mancham as calçadas da romântica Paris, entre números desencontrados e alardes ou desprezos de uma mídia melindrosa, só existe mesmo a palavra tragédia. A mesma tragédia que nesse momento assola as tão famigeradas e clichês redes sociais – aquelas que você usa para dizer que o seu dia foi uma droga, que o trânsito está infernal e que a conta de luz não para de subir. A tragédia da opinião faz com que todos nós – que não estamos em Minas, Paris ou em qualquer outro lugar assolado pela violência neste momento – sejamos vítimas. Vítimas de nós mesmos.
                A necessidade de expressar a sua opinião é muito mais forte do que desejar paz e conforto aos corações abalados pela tragédia, do que doar um galão de água que seja para uma família mineira, do que enxergar as mazelas que estão bem na sua frente no dia-a-dia mas que você não tem tempo pra ajudar a resolver. Expressar-se é banal. Hoje em dia, não se trata de pensar, de escrever, de estudar, de imaginar, de pintar a cara, vestir a camisa, seja o que for. Hoje em dia, a sua opinião é o seu berro de existência – e no momento, não vejo nada de bom nisso. Não vejo nada de bom em usar um espaço universal para propagar o ódio, o extremismo a tristeza. Não vejo nada de bom em criar competições: quem opina melhor? Quem tem mais curtida? Qual dessas tragédias é mais importante?
                Tem vidas lá fora morrendo, se perdendo por conta do terror, se afogando na lama dos outros. Tem gente se escondendo atrás do medo de sair de casa, de praticar sua religião, de assumir seu gênero. Tem gente com medo de viver. E por isso, nada diz, nada grita, nada expressa. Porque dói tudo. E esse berro é pra um universo disposto a se resumir num ombro amigo, num ouvido solícito, numa alma compreensiva.
                Enquanto isso, tem gente com medo de não ser ouvido. E por isso, há tanto berro ecoando entre execuções no spotify e palavras de jornalistas na tevê. Gente que precisa se expor, que precisa intensificar sua própria dor – que apesar de incomparável, não deve ser superior à dor de quem realmente precisa de ajuda no momento. Gente mesquinha, pequena, digna de pena. Covarde demais pra enfrentar o sangue e a lama, pra rezar por tudo e por todos, pra se sensibilizar por um mundo aparentemente perdido como todos nós.
                Hoje eu rezo por Minas, por Paris, pelo México, por Fortaleza, por todos os lugares atingidos pela violência e por você que, dentro da sua necessidade tão grande de gritar, acaba se esquecendo de que tem horas que o silêncio é capaz (lê-se suficiente) de falar tudo que deve ser dito. 

(Ouça o silêncio)

 (Bonsai Madness by Alex Sirén)

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