quinta-feira, 19 de março de 2015

Insignificante

               Hoje eu não quero ver a novela. Desliguei a TV, coloquei aquela música que eu não ouço quase nunca, me deixei levar por uma letra que não conheço, mas que, estranhamente, meus lábios acompanham perfeitamente. Hoje não quero enxergar esses rostos, esses sorrisos, essa gente torpe, mediana, esses que eu julgo por estimação – quando não há mais nada em mim para eu condenar. Hoje eu cansei de contar hipocrisias; uns litros a mais ou a menos de lágrimas correndo pelo meu rosto não querem dizer nada, significam apenas uma faxina íntima... Meu Deus, a quem eu devo satisfações além de mim mesmo? Quantas provas eu devo dar, quantas justificativas, quantos padrões eu ainda devo seguir só para me frustrar ainda mais?
               Já me perdi nesse mundo faz tempo. Mas hoje eu assumo que quero me perder. Aliás, que se dane o que eu quero. Chega desse ódio, dessa mágoa, dessa coisa que invade as telas, os livros, a rotina, os meus pensamentos mais distraídos... Chega dessas regras, por favor. Eu não quero regras para sentir. Não quero nada que me barre como um segurança mal encarado ou uma senhora travestida de Moral featuring Bons Costumes. Dispenso bandeiras e suas cores monótonas; arco-íris, bom, que seja aquele que traça o céu depois da chuva. Não quero gritos, manifestos, socos e pontapés. Não quero nada além de um silêncio abençoado pela minha própria música, feita puramente de contradição. Porque é assim que eu me sinto nesse exato momento: preso a essa liberdade louca e sombria que surgiu de um lugar que eu não conheço, mas é lá que me escondo nesse momento. Eu me escondo de mim porque cansei de mim.
               Nem me ouça. Finja que não falo, que não sinto, que não estou aqui. Porque a verdade é que não estou. Ah, e nem me pergunte onde quero estar... Porque tanto faz. Tanto faz o caminho que devo seguir. Tanto faz o caminho que, ao contrário do que dizem, eu sigo. Tanto faz o que me faz ser tanto. A vida me é pura e simplesmente uma canção que só eu conheço, tão deliciosa e mágica que move meu corpo do primeiro ao último músculo, fazendo cada parte de mim se unir para que eu seja inteiro.
               Dane-se o mundo. Por incrível que pareça, hoje me sinto só mais um Raimundo.  

(Ouça Hold me down, Mansionair) 


(London)

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