Já dizia a poesia: “É verão, sei lá”.
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Boca seca. Palpitação. Tremedeira. Dor de cabeça. Teto
preto. Tudo rodando. Em que ano estamos? Como é que eu me chamo? Quantos graus
tá fazendo? Pra que tantos graus? Por que eu tenho quatro mãos...
Desidratação.
Olha a água mineral, você vai ficar legal. Mas não olhe
simplesmente: OLHA OLHA OLHA OLHA OLHA, ou seja, pare tudo que você está
fazendo e foque na água, meu amigo, foque na água!
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O axé com certeza é o gênero musical (e textual) mais incompreendido
da nossa cultura. Há muito mais do que uma repetição silábica aparente
incoerente. Há um quê afrodisíaco, revigorante, quase transcendental. Eu diria
que é possível atingir o nirvana ouvindo o marido da Cinderela Baiana – ora,
Xandy vem a ser um príncipe, que bonito isso. O axé, meu caro, faz você esquecer que há um sol
infernal debaixo da sua cabeça, tão infernal quanto o cheio da axila (e da
urina) alheia, quanto o fato de você estar numa cidade praiana lotada com
areias e sacos de gelo disputados de tal forma que nos faz questionar o quão
primitivo é o instinto humano.
O axé, meu bem, é um entorpecente. É o tal do “chêro”. É o
que te mantém de pé.
Axé.
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Tudo começou há um tempo atrás na ilha do Sol.
Mas verão que era tudo mentira. Não era amor, era o calor –
cilada é só em fevereiro, ainda estamos enfrentando o final de dezembro,
calminha aí. Verão que aqueles beijos empapuçados de amor (calma, Rita, já
mandei ter calma!) não passavam de fogo, de um fogo que consome as áreas mais
sensíveis do corpo e da alma, um fogo de altas proporções, porém passageiro. Verão
que o tempo cura tudo – até mesmo a ressaca, o excesso de comida pós festas de
fim de ano, a culpa pelas promessas não cumpridas, os afogamentos causados
pelas falhas tentativas de pular sete ondas – talvez você tenha se perdido na
conta, amigo. Verão que você apostou nas cores erradas, porque por mais que
você precise de amor e dinheiro ao mesmo tempo, talvez não seja legal colocar
uma blusa dourada e short de couro vermelho – é verão, sei lá. Verão que esse
teu desespero te acompanha há não sei quantos dezembros, mas que você,
guerreiro que é, ainda tem esperanças no futuro.
Aliás, como será o amanhã? Responda quem puder.
Responde qualquer coisa. Só pra Simone calar a boca.
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Não se deixe abalar pelas ondas do mar (e da galera do
avião), pelo teor etílico acima da média, pelo beijo não dado (ou por aquele
molhado – pra não dizer “babado”), pelo tempo desperdiçado em lojas e
engarrafamentos, pelas falsidades de fim de ano, pelas confraternizações que te
esvaziam a carteira, pelos amigos secretos que te dão facas enquanto você leva
facadas do seu cartão de crédito para comprar seu presente, pelos especiais de
fim de ano na tevê, pela ausência de um mozaum pra beijar durante a queima de
fogos, pelas farturas desnecessárias em pleno 24/25 que na verdade só quer paz e amor,
ah, não se deixe abalar pelo verão, meu caro.
Sê forte.
Sê guerreiro.
Cerve... Não, apenas pare.
(e pegue no compasso).
(ouça a discografia do grande rei da música popular brasileira: Netinho de Milla)
(Mark Hobley)
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