Quase duas horas da manhã. Vamos lá.
Não sei por que escolho a madrugada para escrever. A verdade é que eu não escolho nada; eu é que sou escolhida. Às vezes acho que, como diria Fox Mulder, eu vejo homenzinhos verdes. Ok, o único homenzinho verde que já vi na vida foi um herói de HQ, e aquele sujeito não merecia diminutivos. Talvez eles que me veem... Eu não entendo essas coisas.
Há alguns minutos-quase-hora, me fotografei na frente do espelho. Sem lentes específicas, roupas, maquiagens ou apetrechos – só uns filtros metidos a granfinos. Um rosto cheio de espinhas, uma camisola escorregando no corpo, uma cara de fim de noite com quê de sensualidade, que deve ter sido exalada desses meus poros abertos e dessa minha modéstia que eu perdi em algum lugar, não me recordo aonde.
Neste momento, músicas entram pela minha janela particular. Por conta do carnaval, minha mente está cheia de bolhas, e meus pés, de escaras. O livro que ando lendo é ótimo, porém não consigo chegar à página trinta – até a raiz oleosa do meu cabelo me distrai. A luz desta tela lcd ou lsd me machuca os olhos, ao mesmo tempo em que me provoca os sentidos. Gargalhadas soltas com besteiras dessa virtual insanity. Até que uma canção me surgiu assim, do nada, cintilante, meio desconcertante, me fazendo revirar os olhos aos poucos. A canção que eu já cantei pra mim mesma tantas vezes que já perdi as contas. Aquela que me atiça devagar, me faz abrir um sorriso como quem abre uma garrafa de vinho dizendo: “é pra gente se soltar”. A canção que me devora como quem finge não sentir fome. E aí eu me imagino dançando, flutuando numa noite lenta e eterna (talvez a presença desses dois adjetivos numa mesma frase seja uma espécie de pleonasmo, não sei), com cortinas voando e luzes distantes, num horizonte vivo, acústico, sedutor. A vida dança em horas curtas que só nós entendemos, eu e meu parceiro imaginário, nós e nossa canção real. Eu quero viver por mais cem anos – ou até essa noite acabar. Que guerras explodam, que gritos eclodam, que lâmpadas se queimem (não todas, porque a vista dessa laje é feita de luzes, das luzes dessa cidade que pulsa e nos faz pulsar daqui, junto com ela). Eu quero que o mundo inteiro beije nossos pés cansados de dançar, e então a nossa música acaba. Mas eis que, estranhamente, ela volta a tocar. Meio desafinados, arriscamos nossa voz entorpecida, agudos, graves, tchubirubirus. Rimos. O tempo nos oferece um brinde. Talvez enjoemos, coloquemos uma bossa para tocar, algo que nos faça rir mais um pouco, colando os rostos, os sorrisos, as palmas das mãos. E então, enquanto nossas cinturas tremem suavemente ao novo batuque, colamos nossos olhos uns nos outros, pupilas dilatadas, presas à liberdade da loucura dessa paisagem incrível que somos um para o outro.
Uau, que ousadia a minha.
A próxima canção é gostosa. Desligo a música, vou ver um filme. Talvez ganhe a estatueta esse ano... Não sei, o ator principal não é lá essas coisas. Desligo a tv. Vou dormir.
(Victor Oliveira)
(Ouça a sua música preferida - e caso queira ouvir a que inspirou esse post, ouça something about us, Daft Punk)
Nenhum comentário:
Postar um comentário