sexta-feira, 19 de setembro de 2014

A lista de presentes



               Dia desses, falávamos sobre casamento. Não sei como entramos no assunto, mas sei que eu saí cheia de ideias pipocando aqui dentro. Falávamos sobre essas festas enormes, sobre essa indústria do relacionamento, ah, sobre todas essas coisas que dizemos nos incomodar até um par de véu e grinalda aparecem na nossa frente e um litro de lágrimas rolar. “Me irrita essa gente que gasta uma fortuna na festa e pede até tapete na lista de presentes”, disse uma amiga, claro, em tom de revolta. Rimos, afinal de contas isso não faz nenhum sentido... Opa. O casamento não faz sentido. Sim, estou falando do conjunto da obra. Do véu, da grinalda, do noivo, da noiva, da festa, da lista de presentes. É muito mais do que uma instituição falida: é uma farsa.
               O que vejo por aí são casais estranhos, quase desconhecidos, unidos por um sentimento prematuro que promete grandes voos, mas que, quando violado pela precipitação e pela necessidade de mostrar à sociedade que os cidadãos envolvidos são de bem e querem constituir uma família (?), acaba se tornando inferior à poeira que reveste os álbuns de fotos. Casais que acreditam em pedaços de papel, em tradições toscas, quase risíveis. Casar-se de branco. Não deixar o noivo ver a noiva antes do “sim”. Marcha nupcial. Homem e mulher. Vestidos tão justos que é preciso um balão de oxigênio ao lado da noiva. Daminha, pajem, lua de mel, bem casado, olho de sogra, sogros, pais, parentes, aquela vizinha invejosa que deseja que seu casamento não dure nem três meses, a obrigação de procriar. A terapia de casal. O contrato pré-nupcial. Meu Deus, um contrato. Advogados. Como é que vocês não enlouquecem com isso?
               Mais do que ser contra relações burocráticas, sou contra tudo que pressiona, tudo que cobra, que obriga. Amor não é isso. Não é gastar rios de dinheiro numa festa que nada mais é do que um presente à sociedade “moderna” e “digna”. Não é se jogar num bando de tradições. Não é assinar papéis, fazer contratos, listar as etapas a serem cumpridas como se a vida fosse um grande e cansativo video game. Amor não é casamento – ou pelos menos não é esse casamento que conhecemos.
               Escolher passar a vida inteira ao lado de alguém é a loucura mais linda que eu já vi. Dedicar-se, admirar cada sorriso, enfrentar cada perrengue, se entregar, brigar de vez em quando, deixar o orgulho dar seu chilique mas depois ceder, fazer as pazes, viajar, viver a rotina, tentar quebrar a rotina e acabar fazendo disso rotina, aceitar que o dia a dia pode ser incrível e que você não mudaria nada, nadinha, nem uma gota... Depois de um tempo, festejar o que já foi vivido com um churrasco, uma festa de gala, uma viagem, uma noite num hotel bacana, sabe, só pra tomar um fôlego mesmo... Trocar alianças, sejam elas anéis, brincos, cordões, mãos dadas, fotografias, sorrisos. Vestir-se de branco... e de azul, amarelo, verde, roxo, vermelho, todas as cores, sempre com o intuito de se agradar e de agradar quem se ama, autoestima, bem estar, coisa de gente doida. Só os doidos são felizes porque eles se entregam, se permitem, escolhem serem escolhidos e são escolhidos por suas escolhas, quanta piração! Há mais mistérios e coisas incríveis entre dois seres do que sonha a vã burocracia. Coisas que desvendamos aos poucos, sem precipitações, dívidas, clichês, hipocrisias. E sobre o fato de construir uma família: olha, já ficou mais do que provado que casamentos não são responsáveis por isso. Famílias são construídas e moldadas pelas circunstâncias da vida, e principalmente pelo amor.
               Por isso, não quero me casar. Pode chamar de doideira, filosofia de vida, meta, ah, eu perdi o dicionário, faz favor. Eu quero viver todos os sentimentos que me forem oferecidos, cada partícula, cada centésimo, grão por grão. A pessoa certa não existe, o que existe é o sentimento certo. Quero vive-lo, quero dar todos os passos que meus pés cegos quiserem dar, enfrentando situações, me deixando levar, rolar, eu quero é crescer. E aí, quando estivermos sem fôlego, cansados, exaustos, no problem: vamos fazer um churrasco para comemorar tamanho cansaço, seja qual for sua razão de ser.
               “Poxa, mas quem casa quer casa”. Eu não quero casar, e a minha casa é o mundo que eu descubro a cada dia - ok, sem hipocrisia, a parte da casa eu quero de qualquer forma. Admiro quem vive relações duradouras, eternas, quase sobrenaturais de tão fortes. E pra isso, não é necessário se deixar “molhar” por uma chuva de arroz. Basta amar. Basta querer. E como eu já disse alguma vez, o resto é resto.
               No mais, de onde foi que tiraram o nome “lua de mel”? Me parece doce demais, mas tudo bem, eu respeito, até admiro.
               Sério. 

(Não sei se já indiquei essa música, mas só penso nela: I got you, Jack Johnson)

(Christian Dior)
(Se um dia eu ganhar o Nobel de literatura ou o prêmio Jabuti, é esse vestido aí que eu vou usar ;) )

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